– A diretoria não deve apitar – A.Câmara
Assembléia Geral, categoria sindical e greve
Antônio da Silva Câmara
Professor da faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
Deptº Sociologia/UFBA
Talvez, em função do longo tempo de desmobilização induzida por sucessivas direções as APUB nos últimos reitorados, tenhamos esquecido o que significa deliberação de greve tomada por uma Assembléia Geral. Em texto anterior chamei à atenção para a revogação, pretendida por alguns, de parágrafo da Constituição que assegura o direito de greve e a sua deliberação em Assembléia Geral sem nenhum tipo de procedimento posterior. Na disputa que ocorreu em 1988 os trabalhadores conseguiram impedir este tipo de cerceamento a este direito. Talvez surpreenda a muitos que o instrumento de greve ainda possa ser utilizado para a defesa da classe trabalhadora, pois muitos “novos teóricos” o enterraram com o século XX. Esqueceram no entanto de verificar que ainda estamos em uma sociedade capitalista, sujeita a crises econômicas, e, conseqüentemente à reversão de conquistas obtidas a duras penas pelos assalariados. Em decorrência da presente crise, vemos a Grécia praticamente parada por greves contra as medidas draconianas que rebaixam estupidamente o nível de vida do povo grego, o mesmo se repete na Espanha, na Itália, na Irlanda e em Portugal, que conseguem superar a França (onde as greves jamais deixaram de ser realizadas) e até mesmo nos Estados Unidos, “modelo de democracia” para o pensamento liberal.
No plano teórico, alguns textos clássicos sobre a greve como o de Rosa Luxemburgo (isto já no início do século XX) chamavam a atenção para deliberações que ultrapassavam o âmbito das diretorias sindicais. No limite, sabemos que quem faz a greve é a categoria, o que significa dizer que as diretorias de sindicato devem apenas assegurar as condições para que isto ocorra, pois categoria pode até mesmo se auto-convocar em caso de omissão de seu sindicato (o que mesmo no Brasil é assegurado na Constituição). Uma greve é um momento de afirmação da luta, logo tanto pode fortalecer o sindicato e sua direção, como mostrar a sua inoperância (e isso não pode ser atribuído à oposição de A ou B) ou pior ainda, denunciar o seu compromisso com os governantes e estruturas institucionais. Caso uma greve fosse circunscrita aos limites dos associados de um sindicato não teríamos greve em nenhum lugar do mundo, pois as taxas de sindicalização são bastante inferiores ao número de trabalhadores ocupados (segundo Relatório da a OIT de 2007, a taxa de sindicalizados no Brasil era de 19,1% em 2006). Uma Assembléia deliberativa de greve congrega integrantes de toda uma categoria, para além dos sindicalizados; quando esta ocorre e delibera escolhe também um Comando Geral para encaminhar suas decisões. Nestes momentos de greve a categoria encontra-se auto-representada pois a AG é instituída de modo permanente, logo a diretoria do sindicato mesmo não perdendo suas atribuições quanto ao cotidiano do sindicato, não lidera a greve, isto cabe ao Comando eleito em AG (do qual também a diretoria se torna parte integrante). Se não fosse assim certamente não teríamos a célebre retomada das greves no ABC paulista, (vide o filme documentário ABC da Greve, de Leon Hirszman no qual aparece a força dos metalúrgicos contra a direção sindical que tentava enquadrar a greve).
No caso da presente greve esta deliberação foi tomada em AG, logo diz respeito a todos os docentes desta Universidade, sindicalizados ou não, e apenas em outra Assembléia ela poderá ser alterada ou confirmada. Utilizar os Estatutos da APUB contra a deliberação de base é, sim, cercear o direito de greve, pois se pretende submeter uma decisão soberana a um escrutínio secreto compreendendo parte dos filiados ao sindicato, que poderão ou não confirmar a deliberação do fórum legítimo de deliberação que é a Assembléia Geral. Por outro lado, perguntamos aos que chamam ao plebiscito, como ignorar as unidades que já declararam apoio irrestrito à decisão da AG? Como ignorar os docentes desfilados ou não filiados ao sindicato? Como ignorar os que por convicção não pretendem participar deste referendo/plebiscito(???)? Como ignorar aos que não reconhecem a legalidade do Estatuto? De antemão, parece-me que se tratará da consulta a uma parte dos docentes, talvez apenas aos que preferem a situação atual com um sindicato dócil, que não incomoda as autoridades e não encampa as lutas da categoria, pois parte do principio de que o governo é nosso aliado, logo não devemos criar dificuldades para a sua gestão.
Por esses motivos, não podemos pactuar com o plebiscito/referendo utilizado como arma para desmoralizar a arma mais potente de luta da classe trabalhadora: a greve.
junho 4, 2012 às 12:23 am |
Caro Professor Câmara, bravo! Nenhuma surpresa sobre a sua competência, um texto breve, mas substancial, que nos servirá para discussão de toda luta em função de classe trabalhadora.
O mundo do trabalho sempre e também hoje, como sabe, padece de muita perversão para ganância de poucos e sofrimentos de muitos. Vive-se um silêncio, uma acomodação para não incomodar os que estão no mando, como se tudo estivesse normal. Obrigada Saci, abs.