770 – Elevador da FACED é irmão do Metrô!

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O plástico que recobre as peças do elevador inacabado, esquecido por quem detém a grana da UFBA, enfeia a entrada da FACED, para a tristeza da direção da unidade.

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Para esperar o já quase Godot, de Samuel Beckett, o Saci projetou um disfarce, meramente estético, de pouca valia para os que têm problemas de locomoção.

A.

Menandro Ramos
Prof. da FACED/UFBA

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pequena história que vou contar, agora, foi-me narrada pelo meu amigo de gorro vermelho e pito. É uma história de queixumes, de assombração, de desapontamento, de melancolia. Vendo esse peixe pelo mesmo preço que o comprei na mão do Saci, sem ganhar um tostão de ágio.

Segundo me relatou o do cachimbo, ele a ouviu de um dos vigilantes noturnos da Faculdade de Educação, sob muita recomendação de sigilo da fonte. Fiel à sua promessa, não houve meio de me falar o nome do tal vigilante. Mas isso também não tem muita importância.

Segundo ele, ocorreu dias atrás, em noite de lua cheia e vento frio de julho. Depois de fazer a inspeção costumeira nos três andares da Unidade, o vigilante plantonista acomodou-se por trás do balcão, no andar térreo. Bem na entrada. Como de hábito, acessou um portal de notícias para saber das novidades. Depois de algum tempo de navegação, resolveu tomar um cafezinho para despertar o sono. Foi quando começou a ouvir um ruído estranho. Pareceu-lhe um lamento humano, mas achou a voz um tanto metálica, como se fosse de um robô. Apurou os ouvidos e constatou que a voz vinha de baixo da terra, algo sepulcral. Imobilizado pelo medo, o instinto de sobrevivência o fez agachar-se em posição fetal. Tentara pegar o cassetete, mas a mão quedou-se imóvel, hirta como o mármore. Seu cérebro pensou rapidamente: se for alma penada, é bobagem recorrer às armas. Talvez o celular com câmera e gravador de áudio fosse mais útil. Por mais que procurasse manter a calma, os dedos desobedeciam o cérebro. Pensou em correr. A mesma coisa. O cérebro não mandava os comando para as pernas. Resolveu, então apurar mais e mais os ouvidos. Aos poucos, as batidas do seu próprio coração ficaram mais suaves e pôde, então, distinguir com nitidez uma voz metálica. Ou melhor, vozes metálicas. Sim, porque era um diálogo entre máquinas. Coisa de ficção.

Na quietude da noite do Vale do Canela, o apavorado vigilante percebeu que se tratava de um diálogo, pasme Leitor ou Leitora, entre o esqueleto do elevador da FACED/UFBA e o Metrô de Salvador inacabado, através do solo como condutor das estranhas vibrações comunicativas, reverberando na caixa acústica formada pelas chapas metálicas. Ambos se lamentavam do castigo que a Moira lhes reservara:

– Ah! Meu amigo Metrô Inacabado! Como sou infeliz! Você não sabe o quanto sonhei poder servir à comunidade da FACED. Parte-me o coração quando vejo um cadeirante desistir de fazer um curso aqui na Faculdade de Educação. Vejo que a mentalidade de muitos que administram a coisa pública é a mesma dos espartanos que há mais de dois mil anos lançavam os que nasciam com qualquer deficiência física no Taígeto, um penhasco nas terras gregas destinado ao sacrifício humano. Parece que as prioridade da UFBA são outras…

– Não fale, não, meu caro esqueleto de Elevador da FACED! Eu peno há mais de quatorze anos! São cerca de três milhões de pessoas esperando por mim! O trânsito de Salvador está cada vez mais caótico. São milhões e milhões de reais que ninguém dá notícia do paradeiro, e os cabelos dos conselheiros do Tribunal de Contas cada vez mais embranquecendo precocemente!

– Ah! amigo Metrô! Aqui os cabelos dos dirigentes nem sequer embranquecem… Pobrezinhos! Simplesmente, caem na flor da idade, fazendo exuberar as floresta de calvíce que povoam o mundo…

E esse estranho diálogo avançou pela madrugada adentro, até exaurir o pobre vigilante. Dias depois, ele resolveu dividir o terrível segredo que lhe queimava as entranhas com o meu estarrecido amigo de gorro vermelho e pito.

Você que me lê, é a quarta pessoa a saber dessa insólita história. Na moral.

Uma resposta to “770 – Elevador da FACED é irmão do Metrô!”

  1. Roberto Sidnei Macedo Says:

    Que inspiração meu caro Saci!

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