• Acudam-me, por favor, os Professores de Português!

 

Menandro Ramos
Prof. da FACED/UFBA

Tenho escrito mais do que de costume ultimamente. Ainda que sem muita intimidade com a escrita. Sem medo de me comunicar, mas sempre com uma pontinha de receio em ferir a língua pátria. Ou a minha própria. E sempre à espera de uns bons puxões de orelha dos guardiães do verbo. Daqui e de além mar.

Resolvi correr riscos de uns tempos para cá. Riscando imagens e rabiscando palavras. Fazendo-as amantes ternas. Cúmplices. Estou ficando velho, e não sei quanto tempo a vida ainda me reserva. Quem não se arrisca, não publica. A tática é escrever corrido, ao correr do teclado, ou mesmo da pena, sem muito burilar num primeiro momento, contando com o benefício da dúvida. Vale a pena? Tudo vale, dizia uma certa pessoa. O que não pode é a alma ser mesquinha. Se, por exemplo, eu escrever a palavra “educação” com dois esses, provavelmente alguém dirá que “Foi a pressa”. “Ele é professor!” Que ledo engano! Aqui para nós… Enquanto isso, eu vou me safando, escrevendo e dizendo o que penso. Posteriormente, vou fazendo as correções on-line. Até onde minha ignorância permite. No impresso era um desastre. Escreveu, ficou. Só as incômodas erratas para remediar. Hoje, quem ganhou foi a escrita, pois pode ser melhorada a cada momento. Para o bem ou para o mal…

Claro, que nem sempre tenho meus textos publicados. Nos últimos tempos, a censura está em baixa, mas inventaram a figura do moderador, como mecanismo de controle de críticas indesejadas. Querem a palavra pianinha, domesticada, acadêmica, mas, ainda assim, letras e frases fugidias escapam pelas fissuras dos dedos em forma de zeros e uns,  e a gente pode ir blogando por aí. Por enquanto, sem peias.

Da mesma forma que, outrora, os mais conservadores repudiavam as histórias em quadrinhos, rotulando-as de “subliteratura”, hoje há os que dizem que os jovens não mais lêem e escrevem com a invasão dos videoclips e hipertextos. Deslavado chute. Nunca se leu e se escreveu tanto quanto hoje. Os orkuts, os messengers e os twitters da vida não me deixam mentir. A cada dia, novas grafias e expressões vão enriquecendo os falares e os escreveres do mundo afora.

A língua é móvel. Em todos os sentidos. Frequentemente, temos assistido a dicionarização (ou a intenção) de termos do informatiquês nunca dantes imaginados como deletar, blogar, escanear, reinicializar, leiautar (recuperado do design), peigeapar, peigedaunar, daulodizar, e-meiar, e por aí vai. Interessante é que, todos eles, segundo avalio num rápido exercício de memória, tomam o paradigma da primeira conjugação. Mais uma vez, ganha a língua. A sua, a minha, a nossa.

Veja que chique as colocações dos pronomes, de acordo com as normas da língua culta:

Próclise: Em se leiautando, de forma fashion, ao Palacete da Sereia de Aratuba, acorrerão reservas inimagináveis da ala proifense, avessa à luta e ávida da boa maresia.

Ênclise: E-meia-me, Gal. Isopor!

Mesóclise: Peigeapar-se-á rapidamente os longos e aborrecidos e-mails do Saci, e dos seus amigos, sobre as querelas apubianas.

O curioso é que até o jargão filosófico-existencial não é mais o mesmo. Outro dia, uma amiga segredou-me:

– Ah, meu caro! Se eu pudesse dar um control-z na minha vida!

Recentemente, o meu amigo Saci presenciou algo inusitado numa dessas escolas por aí, e me contou. A professora preocupada em zelar pela gramática, muito delicadamente para não melindrar o aluno, recomendou quase que timidamente:

– Olhe, meu querido, não se separa, com vírgula, o sujeito do predicado.

Ao que o aluno rebateu todo compenetrado:

– Não se separava, Pró.  Isso, muito antigamente! Hoje, os sujeitos são bem mais independentes!…

***

Pra trminar, rog aos colgs de prtugs q m corrijm, por fvor. Tclm q coisa m avisnd. (rss)

Grd bj ,
Menandro

6 Respostas to “• Acudam-me, por favor, os Professores de Português!”

  1. Menandro Ramos Says:

    De uma professora de Português, muito querida, e minha colega de Departamento da FACED/UFBA, recebi uma amável mensagem:

    “Quem não se arrisca, não publica”… e quem publica tamanha inteligência merece que sejam teclados os teclados nos quais estão alojadas certas letras, a exemplo de… a p l a u s o s!!
    Bjs
    ————-
    Fico feliz pelas suas palavras carinhosas, embora saiba que os amigos são sempre suspeitos…

    Se tal mensagem viesse de um certo Gal. Isopor, eu, certamente, não dormiria, hoje, de envaidecido. Ainda bem que meu sono não será perturbado…

  2. Fernanda Gonçalves Says:

    Meu querido,
    Além de genial, seu texto é divertidíssimo!!!

    Agradeço às forças do bem e do acaso(?) tê-lo posto em meu caminho.

    Com afeto e admiração,

    Fernanda

  3. Mary Arapiraca Says:

    Tudo vale, especialmente quando, escrevendo mais ou menos do que de
    costume, se revela pessoa de pena rápida e inventiva, capaz de gastar
    em cada fragmento de texto a pluralidade e integralidade das coisas e
    ideias do universo.

    Beijos, meu Pessoa,

    Mary

  4. Menandro Ramos Says:

    Tenho a impressão que o Saci se sente um pouco filho espiritual de vocês três. Ele sempre comenta comigo o quanto foi bem acolhido pelas generosas amigas (LB-FA-MA) … Quem não gosta de um cafuné?

    Grande beijo para “trambas”, como o traquinas costuma se referir a três pessoas…

  5. Valéria Says:

    Adorei o texto. Achei-o muito criativo e divertido. O senhor encontrou uma forma bastante inusitada para abordar a questão dos neologismos originados pelo advento da internet. Aliás, os “professores de português” certamente sentir-se-ão muito satisfeitos com estilo de escrita tão agradável, pois não só este textos como também outro que já tive oprtunidade de ler apresentam tais características.

  6. Bruno Ferrety Says:

    como faço para unir essas frases?
    *observo que existe preocupação em melhorar a formação dos professores para o uso de tecnologias em sala de aula.
    *oferecer cursos específicos sobre o uso de tecnologias em sala de aula não é suficiente.
    *estudo muito sobre o uso de tecnologias em sala de aula.

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