– Presidente ou Presidenta?

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O Saci me deixou embaraçado ao me indagar sobre a forma correta de chamar a ex-ministra da Casa Civil e agora a primeira mulher mandatária do país. De fato, é uma coisinha muito simples que está dando muito pano pra manga…

Na minha nem sempre santa ignorância, aprendi que poderia ser “presidente” ou “presidenta”.  Agora, entretanto, que o pilantrinha me questiona, de repente, me parece uma temeridade afirmar categoricamente algo que não me aprofundei ou me  embrenhei pelas raízes do léxico, como muitos colegas docentes o fizeram. Aqui – tenho que reconhecer – sou um usuário pífio da língua de Camões, de Machado de Assis e de tantos outros bambas que me encantaram e ainda me enchem de prazer… Assim,  não posso ir além do meu feijão com arroz sem sal e sem tempero, pois, além de tudo, entrei para o clube do hipertensos.

Aí não deu outra. Logo me veio a ideia de recorrer aos universitários gabaritados que de fato entendem do assunto. Assim, passo a bola para os meus colegas da UFBA, os professores do Instituto de Letras.

Como subsídio para o debate, faço constar, abaixo, uma mensagem recebida sobre o assunto.

Saudações,

Menandro Ramos
FACED/UFBA

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DEU NO JORNAL

SUA EXCELÊNCIA, A SENHORA PRESIDENTA DILMA

Agora, o Diário Oficial da União adotou o vocábulo presidenta nos atos e despachos iniciais de Dilma Rousseff.

As feministas do governo gostam de presidenta e as conservadoras (maioria) preferem presidente, já adotado por jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão.

Na verdade, a ordem partiu diretamente de Dilma: ela quer ser chamada de Presidenta. E ponto final.

Por oportuno, vou dar conhecimento a vocês de um texto sobre este assunto e que foi enviado pelo leitor Hélio Fontes, de Santa Catarina, intitulado Olha a “Vernácula” !

Vejam:

No português existem os particípios ativos como derivativos verbais.
Por exemplo: o particípio ativo do verbo atacar é atacante, de pedir é pedinte, o de cantar é cantante, o de existir é existente, o de mendicar é mendicante…

Qual é o particípio ativo do verbo ser? O particípio ativo do verbo ser é ente. Aquele que é: o ente. Aquele que tem entidade.

Assim, quando queremos designar alguém com capacidade para exercer a ação que expressa um verbo, há que se adicionar à raiz verbal os sufixos ante, ente ou inte. Portanto, à pessoa que preside é PRESIDENTE, e não “presidenta”, independentemente do sexo que tenha.

Se diz capela ardente, e não capela “ardenta”; se diz estudante, e não “estudanta”; se diz adolescente, e não “adolescenta”; se diz paciente, e não “pacienta”.

Um bom exemplo seria:

“A candidata a presidenta se comporta como uma adolescenta pouco pacienta que imagina ter virado eleganta para tentar ser nomeada representanta. Esperamos vê-la algum dia sorridenta numa capela ardenta, pois esta dirigenta política, dentre tantas outras suas atitudes barbarizentas, não tem o direito de violentar o pobre português, só para ficar contenta.”

4 Respostas to “– Presidente ou Presidenta?”

  1. osaciperere Says:

    Já me arrependi de ter levantado a lebre polêmica. Até porque com uma caneta e um Decreto-Lei a questão fica resolvida. Afinal, quem pode pode. Pelos menos até o final de um quadriênio…

  2. osaciperere Says:

    Quoting Alberto Cordiviola (changocordiviola@uol.com.br):

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    Prezados,

    Presidenta Dilma ou Presidente Dilma?

    A questão não é, sequer, original. Surgiu com Bachelet no Chile e com Cristina K. na argentina. Os argumentos são os mesmos, pois os idiomas são irmãos quase gêmeos (o texto mencionado no site do sacipereré é literalmente igual ao que correu em espanhol assinado pelo professor Molina): 1) gramatical: presidente é o particípio presente do verbo presidir, ou 2) etimológico: originário do presidens, do latim.

    A palavra Presidenta está nos dicionários (tanto em português quanto no sissudo dicionário da Real Academia Espanhola) e se supõe que palavra no dicionário pertence ao idioma.Aliás, o Houaiss dá presidente, amante, reincidente como sustantivos e adjetivos de dois gêneros, não como particípio presente, figura que muitos gramáticos acham que inexiste em português. A linguagem, qualquer linguagem, é uma entidade viva dado que é ferramenta de comunicação de seres vivos e em transformação permanente. Bem, mas se insiste na discussão sobre presidente ou presidenta. Em espanhol ou em português: leia-se no Chile e Argentina e no Brasil. Simplesmente porque é onde existem ou existiram mulheres na presidência do país.

    Eu me pergunto se “los hermanos” que defendem tanto a correção da linguagem têm suas casas arrumadas por “las sirvientes” ou “las sirvientas”; finalmente, caso existisse, seria o “particípio presente” de servir, nâo?

    Se falarmos de “uma governante alemã” o que imaginamos é Angela Merkel, mas se falarmos de “uma governanta alemã”, imaginamos uma rígida senhora que toma conta das crianças de um burguês ou um nobre.

    Engraçado, né? “sirvienta” e “governanta” pôde, presidenta não….

    Se isto não é machismo, não sei o que é.

    Senhores, e senhoras, que defendeis a machista palavra “presidente” para as presidentas: vão se acostumando pois parece que a tendência está pegando.

    Vale sempre lembrar Cícero: Verba parienda sunt imponendaque nova rebus novis nomina. (É preciso criar palavras novas e às coisas novas devem ser atribuídos nomes novos.)

    Nova rebus novis nomina: MULHER NA PRESIDÊNCIA, PRESIDENTA.

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  3. Menandro Ramos Says:

    Prezado Prof. Cordiviola

    Pessoalmente, não vejo sentido em trazer a questão do machismo, ainda que alguns tentem forçar a barra e introduzi-la numa tentativa de desqualificar a oposição ao atual governo – oposição, diga-se de passagem, diferente da que faz o PSDB e o DEM…

    Creio que o embate é mais ideológico, já que não há ideologia sem linguagem. Quem não quer se alinhar à presidente Dilma Rousseff demarca sua posição exatamente buscando outra denominação diferente da que ela gostaria de ser chamada, como certamente o farão seus eleitores. Essa é a minha hipótese.

    Reporte-se à forma que os proifenses – alinhados ao governo e ao “petismo” – denominam o ANDES-SN (ANDES – Sindicato Nacional). Aliás, o que valeu uma observação perspicaz, tempos atrás, de um amigo de fora da UFBA, desvinculado dos embates sindicais:

    – Se alguém diz “a ANDES”, para fazer referência ao sindicato dos professores das IES (Instituições de Ensino Superior), sei logo que é cabo eleitoral do governo Lula…

    São esses pequenos detalhes, creio, que fazem a riqueza da comunicação verbal que envolve a última flor do Lácio – inculta, bela e sutil (data venia pelo pequeno e temerário acréscimo que faço à lira parnasiana de Bilac!)…

  4. Menandro Ramos Says:

    Recebi por e-mail:
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    Prezado Prof. Menandro,

    Levantei a questão do machismo num e-mail anterior, já faz mais de ano, de um amigo chileno, referindo-se a Cristina Kirchner. Dado que já faz muito tempo que estou afastado da Argentina – muito mesmo, meio século – não tenho nenhuma posição política pela President(?) argentina; somente em algumas ocasiões mais evidentes como o boicote dos ruralistas, tomo partido a favor da presidenta argentina, mas, no geral, não tenho condições de ser “oposição” nem “situação” naquela política.

    Já no caso de Dilma (e, obviamente, Lula) não posso ter o mesmo distanciamento. Definitivamente somente me alinho a eles em oposição ao PSDB-DEM, e em algumas (poucas) coisas pontuais que não têm sentido comentar aqui.

    Certamente, mudar a forma como as pessoas gostariam de ser chamadas é uma forma de as atingir. “Mate o homem mas não mude o nome”. Pessoalmente acho uma das formas mais irritantes (com um sobrenome como o meu, propício a trocadilhos e a deformações, é natural que me irrite).

    Achei conveniente destacar a questão do machismo novamente nesta discussão sobre a presidenta(e) Dilma pela absoluta igualdade de argumentos com que foi tratado no caso da presidenta Cristina K.

    É óbvio que a imprensa hegemônica trata a presidenta Dilma como presidente Dilma para colocar-se claramente como não alinhada ao seu governo; negando-se a reconhecer a forma que ela quer ser tratada. Mas, dessa forma, carrega e difunde também uma questão de gênero.

    E é essa questão de gênero que me interessa destacar.

    Tem até quem, convencido que pela gramática e pelo uso do idioma o argumento é insustentável, alega questões de caráter estético: “a presidente soa melhor do que a presidenta”. Até pouco tempo atrás soava melhor “a engenheiro” do que “a engenheira”. Soava melhor porque existiam poucas, muito poucas, engenheiras. Tinha até arquitetas que gostavam de ser chamadas “arquiteto fulana de tal”: dava mais status… E acho que isto é produto da cultura patriarcal, leia-se: machismo.

    Não pretendo desqualificar alguma oposição ao atual governo, mas se essa oposição usa como argumento de “não alinhamento” este tipo de coisas, no meu entender ela própria se desqualifica.

    Um abraço

    Chango Cordiviola

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