893 – Filosofices acerca das 8 horas na UFBA
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E lá estava o Saci consultando o livro Fedro, do filósofo Platão, sobre os possíveis desdobramentos de uma nova invenção chamada escrita, já em uso na Grécia. Cerca de vinte e seis séculos depois, eis que uma nova previsão pinta no pedaço. Desta vez, na UFBA…
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Menandro Ramos
Prof. da FACED/UFBA
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olta e meia me surpreendo com o interesse do meu amigo de gorro vermelho e pito pela velha e boa Filosofia, amada por uns, criticada por outros e esfaqueada por outros tantos. E pelas costas. No meio desses últimos, está o próprio pilantrinha. Como se não bastasse um gaiato tê-la definido como “uma ciência com a qual e sem a qual o mundo permance tal e qual”, veio Marx e garantiu que “os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes maneiras; agora é preciso transformá-lo”. Foi o suficiente para ele, sentindo-se impotente para transformar a realidade da UFBA, querer interpretar os ditos e escritos sapienciais de colendos filósofos contemporâneos, segundo suas endiabradas sinapses. Tudo começou numa bela tarde do início dos primeiros dias do Ano do Senhor de 2014:
– Chefia! A palavra nunca estanca! É como um ímã que vai atraindo outro ímã, e que vai atraindo outro ímã como num poço sem fundo…
Vi o cartaz na pequena tela do meu tablet que o pestinha segurava. Era mais um “marketing da bondade” praticado pela diretoria da APUB. Depois que a Justiça do Trabalho anulara o plebiscito que queria a desvinculação da APUB do Andes-SN, a referida diretoria estava fazendo tudo para tornar-se simpática aos olhos dos associados. Dessa vez queria encabeçar uma discussão sobre a carga horária docente. Aproveitando o ensejo, um colendo docente do Monte São Lázaro vislumbrou de imediato a oportunidade de se tornar útil com a sua abalizada e douta opinião:
Prezados,
Circula um abaixo-assinado para “modificação do artigo 119 do Regimento da UFBA” e a favor de 8 horas em sala de aula. Não sei qual é exatamente a nova redação que está sendo proposta.
Não temo ser criticado, mas eu gostaria de fazer uma ressalva: creio que apenas aqueles professores que têm comprovadamente atividades de pesquisa, orientação acadêmica e participa de atividades institucionais de extensão poderiam estar habilitados a ter a carga-horária de 8 horas. Professores que não se enquadram nesse perfil deveriam ter, é claro, uma carga-horaria maior em sala de aula (considerando-se que esta é uma atividade nobre, e essa seria sua contribuição relevante à sociedade).
Quero lembrar que devem ser 8 horas em sala de aula por semana e não 8 horas de trabalho semanal [o tempo que um professor dedica a alimentar um blog pessoal, por exemplo, não deve contar como trabalho acadêmico].
Waldomiro Silva Filho
Dep. de Filosofia FFCH
Tão logo tomei conhecimento das importantes considerações do douto colega, também debrucei-me ao teclado e escrevinhei umas toscas linhas.
Prezados Colegas,
Num tempo em que a esperteza do capital ataca impiedosamente o trabalhador e precariza as condições de trabalho com belos e enganadores discursos, todo cuidado é pouco. Que as proposições sejam examinadas com cautela, pois as armadilhas são cada vez mais tinhosas.
Pessoalmente, tenho trabalhado com gosto nas minhas quinze horas semanais de sala de aula e ainda pesquiso muito. Aliás, com muito prazer também. E com recursos próprios, sem depender de agências financiadoras.
Claro que sei que alguns podem até desqualificar o que faço. Faz parte, pois a concepção que têm de trabalho é deveras “carimbada” segundo o modelo neoliberal.
Sendo assim, jamais poderiam admitir que produzir matéria para um Blog, por exemplo, é produzir conhecimento… Produzir arte, então, está fora de cogitação.
Alguns deles preferem replicar citações, e de preferência em Inglês, em papers que jamais serão lidos, e, portanto, totalmente inúteis para a transformação das perversidades que recheiam o mundo…
Mas ainda que se trabalhe com gosto, não se pode abrir mão de marcos regulatórios amplamente discutidos na instância coletiva.
Ainda há pouco eu escrevia sobre a falácia ad hominem…
Atenciosamente,
Menandro Ramos
FACED/UFBA
Como palavra atrai palavra, foi a vez da Profa. Inês Marque, da FACED, não resistir em participar do bom e saudável papo:
Pessoal,
Creio que estas considerações deste professor devem ser lidas com a necessária e devida atenção. Insinua que existem colegas mais folgados, que deveriamter uma carga horária maior com a nobre atividade em sala e adianta que alimentar blog pessoal, não vale. Acho uma séria acusação, pois desconheço quem viva na Ufba só fazendo isto, julgo que esteja desviando o debate.
Saudações
Maria Inês Marques
Sempre atento às mensagens postadas na “debate-l”, lista de discussão dos docentes da UFBA, o Prof. José Roque, do IQUI/UFBA, também se manifestou.
MENANDRO – 15h, JOSÉ ROQUE – 15h e ele QUANTAS? 7h? 6h?
Inês concordo totalmente com V. Sa. Foi na veia.
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ACHO QUE FOI ElE QUE ESCREVEU ESSA JÓIA MENTAL:
“Parece que, de fato, essa lista deixou de ter sentido, sobretudo porque, lamentavelmente, alguns colegas perderam o senso de ridículo”.
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Menandro, por favor descubra o que é senso ridículo? Será que é ficar bem comportado, dizendo amém, sim senhor. É mole?JOROMOTA
Agora foi a vez de uma outra colega também se manifestar.
Caro colega Menandro,
Concordo com vc.
Sds,
Stella Barrouin
MEVZ
Quando eu já providenciava postar todo o fruto da semeadura marketeira da diretoria da APUB, eis que o Prof. Francisco Santana posta uma nova mensagem, dessa vez ressaltando aspectos, às vezes esquecidos, da boa Lógica e da boa Ética.
Oito Horas em sala de Aula
Mais um temerário que ousa desafiar os psicólogos, semiólogos, sociólogos, pedagogos da UFBA.
Eu não me preocuparia em responder-lhe se não achasse de novo que a lógica está sendo maltratada.
Eu sou tão mau psicólogo que juraria que esse Prof. era da área de ciências exatíssimas (exatas é pouco).
Mas parece que não foi só a lógica que foi maltratada, também a ética.
Diz o professor: “Não sei qual é exatamente a nova redação que está sendo proposta”….”mas eu gostaria de fazer uma ressalva: creio que apenas aqueles professores que têm comprovadamente atividades de pesquisa, orientação acadêmica e participa de atividades institucionais de extensão poderiam estar habilitados a ter a carga-horária de 8 horas.”
O dito professor propõe uma ressalva a uma redação que ele desconhece. É UM ESPANTO.
Ele não se deu ao trabalho de ler o abaixo assinado. Para quê? Ele não usa os órgãos normais que os intelectuais usam, os olhos e os ouvidos. Ele fareja viés ideológico. Ao primeiro sinal de alerta ele ataca. Sugiro que ele leia o abaixo assinado no link abaixo:
http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR60198
Eu não tinha também lido o referido abaixo assinado, o fiz agora. Mas mesmo antes, já tinha entendido exatamente o que se queria, por um raciocínio lógico e também pela ética. Partíndo do princípio de que os professores da UFBA são responsáveis e éticos, salvo uma minoria, o que estavam propondo, só podia ser evitar a sobrercarga didática que o governo usa para não contratar mais professores e aumentar o número de vagas de matrícula desproporcionalmente. Isso, LOGICAMENTE teria um efeito positivo também em forçar os departamentos a ampliar as suas outras atividades de pesquisa.
Jamais imaginaria um absurdo de supor que nossos colegas quisessem trabalhar só 8 horas por semana e ir para casa o restantes das 32 horas. Foi um desrespeito à maioria dos professores e às lideranças sindicais e não só ao professor que ele quer atingir antieticamente .
Além do mais, apesar de estar aposentado há algum tempo, sei que a UFBA tem uma estrutura baseada na independência relativa dos departamentos e que são esses que definem o plano de atividades de seus professores. Foi um desrespeito também a esses departamentos e a seus chefes.
O professor Caio Castilhos denunciou recentemente a construção de uma universidade clandestina via representações sindicais não. Mas parece que essa não é a única maneira. Parece que existem também outros caminhos obscuros que ao serem trilhados por certas pessoas, essas se sentem ungidas de um sentimento de impunidade tal que passam arrogantemente a agredir não só colegas, como a instituição e sobretudo a lógica.
Pulando da ética para a lógica novamente. O conceito de atividade nobre do referido professor:“Professores que não se enquadram nesse perfil deveriam ter, é claro, uma carga-horaria maior em sala de aula (considerando-se que esta é uma atividade nobre, e essa seria sua contribuição relevante à sociedade).” É UM ESPANTO.
Segundo portanto esse professor quanto mais nobre a atividade, mais o profissional que a exerce deve ser explorado. É UM ESPANTO.
No conceito usual e mesmo no de mercado, se uma atividade é mais nobre, o profissional que a executa vale mais, e, portanto se fixarmos as horas trabalhadas, o seu salário deve ser maior que os demais e se fixamos o salário o seu tempo de trabalho deve ser menor. No serviço público fixa-se o salário, logo o seu tempo deve ser menor nessa do que nas outras atividades.
Lendo a petição vê-se claro: É Fixado o mínimo de 8 horas em sala de aula e não o máximo de 8 horas em sala de aula.
Repetindo o personagem de JÔ Soares: É UM ESPANTO.
É por isso que aparecem pregadores de bíblia num debate universitário. A pobreza em matéria de lógica e de ética chega a tal ponto que um S. Mateus passa a ter foros de um Aristóteles ou Kant, Hegel, sem falar no cérebro do milênio (segundo a BBC) Marx.
Se não me engano foi Bertrand Russel (corrijam-me se foi outro) que disse que a única coisa de interesse filosófico no Novo Testamento foi a pergunta de Pilatos: “O que é a verdade?”
Mas depois dessa intervenção de um representante laureado da FFCH, o professor José Roque vai matar a pau com a parábola dos trabalhadores da vinha, Mateus 20, 1-16.
Vide Evangelho Mateus no comentário abaixo.
Obs.: Nenhum diretor da APUB vai defender a petição que lideram? E há diretores de FFCH.
Francisco Santana
De fato, talvez o pestinha do Saci esteja com a razão. A palavra nunca estanca! É como um ímã que vai atraindo outro ímã e que vai atraindo outro ímã como num poço sem fundo… Mesmo que a memória morra ou que os blogs pereçam, nossas filosofices haverão de encontrar sempre um lugar para a palavra florescer.
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– O maravilhoso disso tudo, chefia – lembra-me o Saci enternecido – é que a escrita salvou Platão do esquecimento. Oxalá o blog faça o mesmo com Platinho…
janeiro 10, 2014 às 10:46 pm |
Naquele tempo falou Francisco Santana:
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Evangelho Mateus 20 1-16a
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Mateus.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos esta parábola: 1.“O Reino dos Céus é como a história do patrão que saiu de madrugada para contratar trabalhadores para a sua vinha. 2.Combinou com os trabalhadores uma moeda de prata por dia, e os mandou para a vinha. 3.Às nove horas da manhã, o patrão saiu de novo, viu outros que estavam na praça, desocupados, 4.e lhes disse: ‘Ide também vós para a minha vinha! E eu vos pagarei o que for justo’. 5.E eles foram. O patrão saiu de novo ao meio-dia e às três horas da tarde, e fez a mesma coisa. 6.Saindo outra vez pelas cinco horas da tarde, encontrou outros que estavam na praça, e lhes disse: ‘Por que estais aí o dia inteiro desocupados?’ 7.Eles responderam: ‘Porque ninguém nos contratou’. O patrão lhes disse: ‘Ide vós também para a minha vinha’. 8.Quando chegou a tarde, o patrão disse ao administrador: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes uma diária a todos, começando pelos últimos até os primeiros!’
9.Vieram os que tinham sido contratados às cinco da tarde e cada um recebeu uma moeda de prata. 10.Em seguida vieram os que foram contratados primeiro, e pensavam que iam receber mais. Porém, cada um deles também recebeu uma moeda de prata. 11.Ao receberem o pagamento, começaram a resmungar contra o patrão: 12.‘Estes últimos trabalharam uma hora só, e tu os igualaste a nós, que suportamos o cansaço e o calor o dia inteiro’.
13.Então o patrão disse a um deles: ‘Amigo, eu não fui injusto contigo. Não combinamos uma moeda de prata? 14.Toma o que é teu e volta para casa! Eu quero dar a este que foi contratado por último o mesmo que dei a ti. 15.Por acaso não tenho o direito de fazer o que quero com aquilo que me pertence? Ou estás com inveja, porque estou sendo bom?’ 16.Assim, os últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos”.
– Palavra da Salvação.
– Glória a vós, Senhor.